Escrevemos
em nome de uma assembleia popular que foi criada espontaneamente para dar
resposta a um descontentamento popular face a uma decisão da Câmara local de
desenvolver uma intervenção urbanística sem dar quaisquer informações aos seus
munícipes, moradores, comerciantes e demais interessados.
Move-nos
a esperança de conseguir a Vossa ajuda para alterar o rumo de um processo que,
para além do que já referimos, nos parece aberrante do ponto de vista
ambiental, paisagístico, arquitectónico, social, económico e funcional (para a
cidade).
Trata-se
da construção de um parque de estacionamento no interior de um quarteirão
habitacional em pleno centro histórico de Guimarães, a escassos metros
da área classificada como Património Cultural da Humanidade.
É uma
acção da exclusiva responsabilidade do Município sobre a qual - após múltiplas
tentativas - ainda não conseguimos esclarecer quais os argumentos que
a sustentam.
Ainda
assim, continuamos a desenvolver esforços no sentido de obter informações
e dialogar com a Câmara Municipal de Guimarães.
Tal não
tem sido facilitado e, antes que se iniciem as obras de construção,
gostaríamos de apontar alguns dos motivos que nos movem e moverão porquanto nos
parece injusto que - sem um debate e consenso alargado - se estrague
irreversivelmente um Património que se mantém vivo após mil anos de
desenvolvimento desta cidade.
Com efeito:
a) Seria porventura natural que uma
cidade com um centro histórico Património da Humanidade tivesse um plano de
gestão do Bem Cultural inscrito na UNESCO. No entanto, não só não existe
como não parecem existir os estudos parcelares que sustentem grandes
alterações ao Património que - a priori - se pretende valorizar através da
continuação de actuações de conservação urbana, que mereceu durante anos a
Guimarães o estatuto de exemplo nacional e internacional.
b) Nesse sentido, não se conhece um
estudo sobre a mobilidade integrada em Guimarães onde porventura poderíamos
aferir se, de facto, haverá necessidade de mais parques de estacionamento para
automóveis em Guimarães, onde se devem localizar e de que tipo devem ser.
c) Não obstante o exposto, decidiu o
Município - sem discussão pública - construir um parque com capacidade
para 500 lugares de estacionamento automóvel.
d) Esta edificação ocupará o interior de
um quarteirão delimitado, maioritariamente, por edifícios do século XIX.
e) A maior parte dos edifícios são
habitacionais e, ainda que existam edifícios devolutos, seria expectável e
desejável que a Câmara continuasse o processo que iniciou na década de 80, de
melhoramento das condições de vida no centro urbano, de modo a promover um
centro urbano vivo, habitado.
f) A implantação do edifício do parque
incidirá sobre os terrenos onde hoje existe um grande stock de “verde
privado urbano” - sendo porventura o único quarteirão do centro histórico com
uma verdadeira área privada permeável, não construída.
g) A implantação do edifício porá fim a
esse património paisagístico e a esse “stock verde” que, sendo importante
para as edificações envolventes, não é menos importante para a qualidade
ambiental de toda a cidade. Algo que será colocado em risco.
h) A intervenção significará o
apagamento da estrutura cadastral, das especificidades do parcelário
urbano, muito específico, diferenciador e, só por si, um património
de valor não mensurável, onde se inclui, para além das habitações, antigas
fábricas de curtumes, que a própria Câmara procura classificar como Património
da Humanidade.
i) No seguimento do ponto anterior, só
será possível esta operação através da aquisição e/ou expropriação sistemática
dos lotes necessários ao edifício e seus acessos, e fazer “tábua rasa”
deste histórico da evolução urbana.
j) Nesse sentido, está em causa a
transformação de um património que envolve múltiplos proprietários, moradores,
arrendatários, comerciantes - passando para a hegemónica propriedade
municipal - expulsando, directa ou indirectamente, as populações locais.
k) Os proprietários, moradores e utentes
em geral desta área não foram ouvidos ou sequer presenteados com as premissas
que determinam este investimento e as suas implicações, designadamente
económicas (quer para os privados quer para o erário público).
Outros
aspectos que consideramos já de pormenor - ainda que reveladores da
inconsistência e desadequação desta decisão para este local:
l) A morfologia urbana,
especificamente nesta área, é caracterizada por ruas estreitas, inclinadas, que
pouco ou nada se coadunam com o tráfego rodoviário. Aspectos de pormenor que
pudemos observar no projecto de arquitectura revelam aspectos anedóticos,
designadamente na entrada e saída do parque. Anedóticos na medida em que
evidenciam a brutalidade da imposição deste equipamento motorizado sobre um
contexto humanizado sensível.
m) Para além dos
aspectos sócio-económicos e de morfologia do edificado, as
especificidades topográficos, geológicas e hidrológicas desaconselham uma
intervenção deste tipo. A inclinação do terreno, as linhas de água que
atravessam os terrenos e irrigavam os jardins e hortas, o solo
rochoso, granítico, sobre o qual assenta a nossa cidade - são todos
aspectos que podem ser ultrapassados com elevados investimentos que provocarão
danos ambientais irreversíveis.
n) São vários e graves os problemas
sociais e económicos que uma parte da população local atravessa nos últimos
anos e, neste contexto económico desfavorável, torna-se ainda mais gritante o
dispêndio de milhões de euros para fins não justificados e com impactos
negativos claramente identificáveis.
São inúmeros os aspectos que poderíamos
continuar a elencar.
Mas dirigimos a seguinte questão
provocatória: Será esta iniciativa uma condição para se conseguir o estatuto
de Capital Europeia Verde?
Com os melhores cumprimentos,
Assembleia Popular da Caldeiroa
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